domingo, 16 de agosto de 2009

Livre associação...
Na semana em que assisti ao filme, lia o texto da psicanalista Kehl (ressentimento). Olha só:
"A leitura dos relatos de Primo Levi sobre os campos de concentraçao faz ver ao leitor que mesmo nas condições de opressão absoluta alguns prisioneiros mantiveram diante do algoz uma posição subjetiva que não predispõe ao ressentimento. Há quem seja capaz de, obrigado pela força a beijar as botas de seu carrasco, não viver esse ato de forma humilhante. A vergonha, a abjeção, escreve Levi, devem ficar do lado do homem que, tendo liberdade de escolha, quis forçar seu semelhante a um ato abjeto. No limite, alguns prisioneiros escolhem a morte como meio de preservar sua humanidade. Morrer, ou deixar-se matar, é a afirmaçao extrema de insubmissão sob regimes totalitários - nessas condiçoes seria uma leviandade incluir certos casos de suicídio sob a rubrica de melancolia. Mas a prova de que a organização dos campos de concentraçao sob o nazismo tinha como objetivo produzir a desumanizaçao dos prisioneiros é que os índices de suicídio nos lager foram muito baixos. Desprovidos de qualquer implicação subjetiva em relação ao mal e à abjeção, reduzidos à condição de coisa, vitimas absolutas do arbítrio do outro, os homens deixam-se abater passivamente, sem lançar mão do último recurso que distingue o humano do animal: a capacidade de escolher a própria morte".
Kehl, Maria Rita. Ressentimento. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2004, p. 16.

Um abraço.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Voilá! Obrigada pela oportunidade!


Direção: Lars Von Trier
Ano de lançamento: 2000

Voilá! Obrigada pela oportunidade!

Adeus tédio dos domingos!!!
Os filmes que aqui serão comentados dão abertura a um entendimento que vai além da apreciação estética em si. Penso que poderemos compartilhar, a partir dos mesmos textos visuais, descobertas e interpretações diferentes e deliciosas!!!! E, sobretudo, divertirmo-nos com o olhar que passeia com o olho do outro, ou, pela lente do outro.
Abrimos a sessão com o filme do Lars Von Trier, Dancing in the Dark (Dançando no escuro) com a diva Catherine Deneuve e Björk. Esse filme recebeu uma indicação ao Oscar.
Conheci o trabalho de Lars von Trier assistindo a sua obra mais “popular”, Dogville, primeira parte de uma trilogia sobre os Estados Unidos. Fiquei impressionado com o que vi e foi inevitável que eu procurasse os antigos trabalhos do diretor, DENTRE ELES, Os Idiotas (que ainda não vi, acha?)
Dançando no Escuro é uma narrativa que se passa em 1964 e tem como principal mote a história de Selma, (interpretada por Björk) uma imigrante do Leste Europeu que vai para os Estados Unidos acompanhada de seu filho. Portadora de uma doença hereditária que a deixará cega em pouco tempo, Selma trabalha dia e noite com um só objetivo: pagar a cirurgia para o filho que sofre do mesmo mal. A paixão por filmes musicais torna-se a única válvula de escape da pobre moça em sua vida tão difícil.
A produção intercala o eixo narrativo principal com números musicais, que são apresentados como devaneios da personagem central. Mesmo em momentos de extrema tensão, Selma aliena-se do que está a sua volta e brilha em grandiosos espetáculos imaginários, muito bem realizados pela atriz principal e pelo diretor. As coreografias estão bem feitas e as músicas são primorosas, contando com o toque especial da harmoniosa e pungente voz de Björk.
A cantora está simplesmente perfeita no papel. Encarna a personagem mantendo-se verossímil do começo ao fim, encantando e comovendo o público. Revela-se uma artista completa: além de ter uma voz singular, provou ser uma brilhante atriz, o que lhe rendeu o Globo de Ouro e um prêmio em Cannes. Sem dúvida, merecidos.
A crítica aos Estados Unidos é clara na película. Selma, que foi para o país em busca de uma solução para seu problema, é explorada e acaba tendo um fim trágico. Poucos não irão se revoltar e se comover com a história, que é triste em um nível não visto em produções hollywoodianas. Cruzando a ficção e a realidade Trier é impiedoso com a personagem central, assim como a América o é com os que se aventuram lá. Uma história imperdível da realidade dura e cruel contrapondo-se à felicidade romântica das fantasias. Bonita obra, que há de ser apreciada pelos adoradores do bom cinema. (C...)